Se o Universo conspira mesmo a nosso favor eu não sei, mas que eu e o player do meu celular temos uma fina sintonia, isso eu não posso negar.
Foi hoje, às 7h57, quando desembarquei do trem Osasco/Grajaú na Estação Vila Olímpia, indo pro trabalho. Faz algum tempo que tenho notado a presença de uma garota um tanto quanto... atraente, digamos. Mas o que mais me chama atenção é o olhar dela. Extremamente intrigante. Olhos intensos, sem boiolagem, penetrantes. Disfarçado atrás das lentes escuras do meu óculos, ela não vê (ou vê e finge que não vê) que estou olhando, paralisado, para aqueles lindos olhos escuros.
Tocava "Escândalo", ao vivo no "Noites do Norte", de Caetano, quando o trem abriu a porta. Saí sem pressa. Não ia fazer diferença correr se só faltavam três míseros minutos pra entrar no serviço. Não ia chegar mesmo, por isso, desci sem pressa. Logo atrás de mim, ela. Me seguiu até a escada e, só Deus sabe como, colocou-se ao meu lado, me olhando atrás das lentes do óculos de armação azul claro. Belo óculos por sinal.
Eu olhei pra ela. E ela, direta, sorriu e disse:
- Acho que você está atrasado hoje, né?!
Eu tirei o fone, salivei, engoli, pensei, repensei, desci da escada, sorri e respondi:
- Acho que sim... mas como é que você sabe?
- Sempre pego um trem antes desse e você sempre está nele. Hoje me atrasei, entrei num trem depois e você estava nele. Acho que se eu estou atrasada, você também está atrasado.
- Ótimo! De fato estou atrasado... mas é pouca coisa.
- Entra às 8h?
- Entro e vc?
- Também.
- Sai a que horas? Vai embora de trem?
- Saio às 17h30 e às vezes vou de trem, outras vezes de carona.
- Hum... legal... quer me passar seu email?
- Anota aí.
- Certo... e... onde você trabalha?
- Aqui na Cardoso mesmo. Você sobe a Gomes, né!?
Nesse momento fiquei com medo de estar sendo seguido por alguma maníaca ou uma serial killer que já vinha me seguindo a algum tempo e queria me matar porque meu óculos também era azul.
- Isso.
- Ah... legal.
- ...
- Vou por aqui. - Parou, me olhou e ficou esperando alguma coisa...
- Certo! - Dei um beijo no rosto e desejei um sonoro bom dia... porque o meu, com certeza será um ótimo dia! - Eu te mando email...
- Ok. Até.
- Até. Tchau.
Nesse instante um sorriso escapou pra minha boca, eu recoloquei o fone que tinha tirado e, num passe de mágica, o acordo soou no ouvido:
"Meia lua inteira
Sopapo na cara do fraco
Estrangeiro gozador
Cocar de coqueiro baixo
Onde o encanto se encantou"
E eu ri até sentar na minha mesa.
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