15.10.12

Epifania


resolvi escrever pra me sentir vivo de novo. to sufocado, desesperado, semi-morto, completamente lúcido, amarrado dentro de mim mesmo, a maldita jaula física que limita nossos dias, nossa maneira de viver a vida e nos acorrenta a uma sociedade de semelhantes diferenças sutis que nos fazem um só aglomerado de corpos, cabeças não pensantes, mentes hibernantes, caminhando todos os dias pra lugar nenhum tentanto encontrar coisa alguma.
porque acordei de madrugada e vi meu corpo estendido, imóvel na cama, cansado, fudido e frustrado por ter de fazer o que todos fazem numa luta incessante por um sucesso parcial e controlado, um triunfo dos outros, uma vitória de todo mundo que joga o mesmo jogo, luta a mesma luta.
porque estou preso e se eu gritar ninguém vai ouvir e se alguém ouvir não vai entender porque gritar não é maneira de manifestar indignação e sim de manifestar loucura para uma sociedade doente que se julga sã para julgar os insanos.
resolvi escrever para anestesiar a dor que eu sinto.
o medo que acua.
o fracasso que persegue.
a vegonha que derruba.
o presente que me negam
o passado que me condena
o santo, o demônio
o bonito e o feio
a falta de futuro.
o brinde dos enfermos.
o começo do desespero coletivo ao descobrir que o sono que vivemos tende a ser o nosso fim.




"a vida está na concretude da merda que move o mundo
a vida está na indústria impulsionada a sangue humano
a vida é comer e cagar. e logo preciso comer de novo
ou encontrar com quem fazer amor
ou participar da matança geral, ou esfolar um porco
qualquer coisa que me ponha em contato com a vida chamada real..."

Marcelo Rubens Paiva, em "Blecaute".