23.6.09

Faz tempo...

Ando muito distante do meu blog. E não é de propósito.

 

As coisas andam muito corridas, até teria algumas novidades pra contar, mas não consigo escrever como gosto de escrever, sobre essas novidades. As coisas ainda ficam vagando na minha cabeça sem uma ordem lógica... pra não manchar o meu querido blog, eu esqueço dele um pouquinho. Sabe como é... a sabedoria também está em saber ficar quieto. E essa é minha hora de estar quieto. Pelo menos até a próxima quarta-feira, quando este que vos fala sai de férias rumo a primeira capital tupiniquim, sol, axé e muita coisa boa. De lá, juro que posto novidades com mais assiduidade. Enfim...

 

Só pra deixar registrada minha indignidade...

 

Esses dias o elevador do prédio em que estou trabalhando atualmente deu pau. No prédio são 4 andares da empresa em que eu trabalho e o resto é telemarketing. Imaginem vocês, queridos, a quantidade de gente estranha que eu vejo todos os dias... pois bem... O elevador parou no 12º andar, abriu a porta no meio dos andares e foi descendo, devagar, com a porta abrindo e fechando.

Antes de todo mundo entrar em pânico, uma das meninas, inconformada com a situação, soltou um sonoro:

 

- Vai estourar minha pausa.

 

Nesse dia voltei pra casa repensando todos os valores da raça humana. Incrível.

7.6.09

VAZIO...

E eis que me deparo com João Cabral de Melo Neto. Perfeito...

O amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. O amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. O amor comeu meus cartões de visita. O amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.
O amor comeu minhas roupas, meus lenços, minhas camisas. O amor comeu metros e metros de gravatas. O amor comeu a medida de meus ternos, o número de meus sapatos, o tamanho de meus chapéus. O amor comeu minha altura, meu peso, a cor de meus olhos e de meus cabelos.
O amor comeu meus remédios, minhas receitas médicas, minhas dietas. Comeu minhas aspirinas, minhas ondas-curtas, meus raios-X. Comeu meus testes mentais, meus exames de urina.
O amor comeu na estante todos os meus livros de poesia. Comeu em meus livros de prosa as citações em verso. Comeu no dicionário as palavras que poderiam se juntar em versos.
Faminto, o amor devorou os utensílios de meu uso: pente, navalha, escovas, tesouras de unhas, canivete. Faminto ainda, o amor devorou o uso de meus utensílios: meus banhos frios, a ópera cantada no banheiro, o aquecedor de água de fogo morto mas que parecia uma usina.
O amor comeu as frutas postas sobre a mesa. Bebeu a água dos copos e das quartinhas. Comeu o pão de propósito escondido. Bebeu as lágrimas dos olhos que, ninguém o sabia, estavam cheios de água.
O amor voltou para comer os papéis onde irrefletidamente eu tornara a escrever meu nome.
O amor roeu minha infância, de dedos sujos de tinta, cabelo caindo nos olhos, botinas nunca engraxadas. O amor roeu o menino esquivo, sempre nos cantos, e que riscava os livros, mordia o lápis, andava na rua chutando pedras. Roeu as conversas, junto à bomba de gasolina do largo, com os primos que tudo sabiam sobre passarinhos, sobre uma mulher, sobre marcas de automóvel.
O amor comeu meu Estado e minha cidade. Drenou a água morta dos mangues, aboliu a maré. Comeu os mangues crespos e de folhas duras, comeu o verde ácido das plantas de cana cobrindo os morros regulares, cortados pelas barreiras vermelhas, pelo trenzinho preto, pelas chaminés. Comeu o cheiro de cana cortada e o cheiro de maresia. Comeu até essas coisas de que eu desesperava por não saber falar delas em verso.
O amor comeu até os dias ainda não anunciados nas folhinhas. Comeu os minutos de adiantamento de meu relógio, os anos que as linhas de minha mão asseguravam. Comeu o futuro grande atleta, o futuro grande poeta. Comeu as futuras viagens em volta da terra, as futuras estantes em volta da sala.
O amor comeu minha paz e minha guerra. Meu dia e minha noite. Meu inverno e meu verão. Comeu meu silêncio, minha dor de cabeça, meu medo da morte.